sexta-feira, 6 de agosto de 2010

Britney, Haydn e esquizoanálise.

Britney Spears vai lançar disco novo em dezembro, mês de seu aniversário inclusive. a matéria do site Popline divulga apenas isso: que ela lançará disco novo, não fala sobre música, sobre clipe, inclusive o empresário da moça diz que está evitando criar boatos sobre o novo trabalho - enquanto alguns artistas precisam de cada vez mais boatos, que as pessoas pensem e discutam sobre o que viu, que o artista esteja nos TT do Twitter, a Britney, e até deve, evitar que se fale sobre ela, para, na realidade, deixar que os fãs criem suas próprias ideias, suas próprias especulações sobre o que ela vai fazer. diferente de como anda acontecendo com a Katy Perry, por exemplo, que é consideravelmente nova nesse negócio, anda joando muitas fotos, trechos de músicas, stills de clipe, anda contaminando a internet com a cara dela. a Britney já usou muito dos boatos e do imaginário para se divulgar, ela (ou seus produtores e empresário, o que for) e Michael Jackson são gênios da publicidade.

falando em Britney Spears, alguém já ouviu falar de Max Martin, Pharrell Williams e Chad Hugo, Cathy Dennis e Bloodshy & Avant e Jonback, N. Hills e J. Washington e K. Hilson e Marcella Araica, Nikesha Briscoe e Rafael Akinyemi? estes são apenas alguns dos compositores dos hits da Britney. na música Pop há um desprendimento incrível em relação a compositor vs. intérprete. na música Clássica, o compositor era o próprio intérprete de suas músicas, e as músicas eram feitas para uma ocasião específica, não se compunha com essa intenção de guardar para a posteridade. não existia, na realidade, nem a ideia de artista, o compositor era apenas um outro funcionário da corte (o cozinheiro cozinha, o jardineiro jardina, a faxineira faxia, e o músico musica, nada mais natural), até porque não existia winamp, nem ipod, na realidade, não existia nem rádio no século XIX. a música Pop de agora (Britney, Lady Gaga, Restart) me dão a impressão de terem esse teor "descartável", por exemplo quando se coloca pra tocar numa festinha a canção "I'm a slave 4 you" (2001, de Pharrell Williams e Chad Hugo), é comum se ouvir a expressão "que música velha!", equanto se se coloca pra tocar "Twist and Shout" (1962, Phil Medley e Bert Russell), costuma-se apenas achar divertido e as pessoas dançam. no entanto, as duas músicas têm semelhanças, por exemplo o fato de não se conhecer o compositor delas - a primeira é "da Britney" e a segunda "dos Beatles".
este desconhecimento do compositor é algo que vêm da música Romântica. o movimento Romântico, e toda a subjetividade posta em cima das produções do estilo, colocaram o compositor em uma posição de artista. não só por causa da complexidade composicional e técnica, mas também devido às questões de inspiração, de respeito às vontades do compositor, nota-se diferenças muito grandes entre Haydn (1732 – 1809) e Beethoven (1770 – 1827) - Haydn compôs 104 sinfonias, Beethoven compôs 9. com Beethoven começou a surgir a mistificação do artista, essa ideia de que "ele é louco, mas tudo bem, porque é artista". se Haydn fosse considerado muito excêntrico, ele seria demitido e fim de papo (esse detalhe é perceptível no filme Amadeus, que conta a história de Mozart (1756 –1791), contemporâneo de Haydn). depois do período romântico começou-se também a escrever para a posteridade, maestros conduziam peças de outros compositores, aspecto que é fácil de perceber hoje em dia - vemos o tempo todo concertos de todo tipo de compositor de várias épocas.

enfim, começou a se separar as posições da produção musical (a diferença entre intérprete e compositor), mas para nós isso não soa nem um pouco estranho, porque nossa cultura musical é muito mais popular que erudita. por exemplo no Jazz e na Bossa-nova é até mais comum algum intérprete cantando uma música de Gershwin e do Tom Jobim, que os próprios compositores, no entanto, nesses estilos conhece-se os compositores (sabemos que "Sometimes" que a Janis Joplin canta é uma composição do Gershwin, e que "Como nossos pais" é do Belchior). o que eu acho incrível e terrível na música Pop (há diferença entre música popular e música pop que eu ainda não sei explicar exatamente, mas essa é uma delas) é que não se conhece o compositor, e nem mesmo se quer conhecer. quer dizer, não faz diferença. o intérprete, no final das contas, não passa de um "bode expiatório", a cara para uma música qualquer. um caso espetacular é o da Lady Gaga, que usa aquela imagem no maior estilo Matthew Barney, e canta aquela música no maior estilo urso Barney (não vejo diferença nenhuma entre a música da Lady Gaga e do Günther, por exemplo, é Euro-dance-gay, a imagem não condiz de forma alguma).

não que alguma dessas coisas sejam condenáveis, são apenas condições da evolução ("evolução" no sentido de mudança, e não de melhora) da música popular e pop. estamos em uma época muito eclética e dialética, todas essas formas de composição e de produção artística convivem e se transformam, e se negam e se completam de forma que daqui a pouco outra forma de música nasça, como é o caso incrível dos artistas de iamamiwhoami, não se sabe que são. quem é a cantora? quem é o compositor? quem produzi os clipes? tem discos? e o nome diz tudo "eu sou eu quem sou eu", essa ideia esquizoanalítica de não interessar as origens, objetivos, significados, o que é importa e que é o que é enquanto é, é o acontecimento em si, causa e efeito em si mesmo.

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